As exuberantes claridades do
Século das Luzes não foram suficientes para arrancar a criatura humana do
materialismo e do pessimismo. Enquanto as Escolas de pensamento se debatiam nas
rudes procelas do cepticismo e da negação, apoiadas sobre os alicerces do
mecanicismo científico, afirmando a morte do ser no momento da anóxia cerebral,
igualmente alargavam-se os horizontes da investigação em torno da personalidade
e do comportamento, da psique e da saúde mental, tentando-se compreender a
estrutura profunda do inconsciente e da sua constituição neurológica.
Teorias grandiosas apareciam
com entusiasmo e emurcheciam dominadas por outras não menos esdrúxulas, que
deslumbravam as mentes aturdidas e cansadas do Deus teológico e arbitrário, que
atemorizava e punia sem compaixão em nome do amor que preconizava em Seu nome.
Pensadores cristãos sinceros,
não obstante, proclamavam a necessidade de uma releitura do Evangelho baseados
na necessidade de uma renovação moral fundamentada em Deus e liberdade.
Espíritos notáveis reencarnados, quais Lamennais, Lacordaire e outros lídimos
servidores do Bem, após iniciarem a nova era do pensamento cristão através do
seu periódico L'Avenir, convidando os teólogos e estudiosos católicos a uma
revisão dos textos evangélicos e aplicação mais consentânea com os dias de
então, viram o seu órgão ser fechado pela intolerância clerical, em tentativa
cruel de silenciar-lhes a voz, mas não desistindo de dar prosseguimento à luta
em favor de uma sociedade feliz e realmente cristã conforme os postulados
enunciados e vividos por Jesus.
Dessa forma, pairava na
psicosfera cultural da França e do mundo, algo de extraordinário que deveria
acontecer para alterar completamente e por definitivo a conduta religiosa que
se debatia nos estertores da obstinação medieval, sobrevivente a todos os avançados
passos do conhecimento existente. Eram os prenúncios da chegada do Espiritismo,
cujos missionários responsáveis pelo ministério já se encontravam reencarnados
uns, enquanto os outros preparavam a instalação da Nova Era.
O materialismo vigoroso era a
resposta das conquistas logradas nos laboratórios e da reação filosófica de
homens e mulheres que não mais se submetiam aos ditames escravocratas das
paixões que produziam o fanatismo religioso, sempre distante da realidade,
porém, dominante e perverso.
A razão, naqueles dias,
libertava-se dos grilhões do magister dixit e a severa vigilância na literatura
que somente podia proclamar aquilo que estivesse sob os ditames da revisão
religiosa autorizada pelo Imprimatur da Igreja começava a perder força e poder.
O panfletismo e as impressões desautorizadas sacudiam as mentes e os corações
que aspiravam por liberdade abrindo os horizontes da fé para novas
conceituações e procedimentos.
Foi nesse báratro que surgiu O
Livro dos Espíritos, publicado pela coragem moral e cultural de Allan Kardec,
graças ao compromisso estabelecido com o Sr. Dentu e mantido pela sua viúva
Sra. Mélanie, que lhe honrou a memória, ensejando a impostergável revisão e
reestudo da doutrina de Jesus sob a óptica da Razão e da Ciência, confirmando a
indestrutibilidade do Espírito, a sua comunicabilidade com os seres humanos, a
reencarnação, e apresentando a ética-moral que ressuma do Seu Evangelho, e que
se encontrava mergulhada no abismo da ignorância e dos interesses subalternos.
Com as novas propostas
espíritas, os camartelos do bom senso e da investigação abriram as carcomidas
bases das religiões dominantes, facultando novas incursões filosóficas na
interpretação dos textos de Jesus e dos Seus discípulos, que trouxeram coragem
e alegria de viver aos milhões de sofredores aquartelados nos sombrios redutos
da ignorância, do medo ou do desespero e da revolta...
O Espiritismo veio confirmar a
promessa de O Consolador proposta por Jesus antes de despedir-se dos amigos,
com os notáveis instrumentos da investigação científica e do pensamento ético,
ensejando a religião do amor e da razão, únicos requisitos que podem oferecer
resistência contra o mal e a perversidade histórica sempre presente nos
comportamentos humanos.
Inesperadamente, face ao cinismo
e à vulgaridade que o materialismo propunha ao comportamento com expressões
hedonistas desgastantes, sentindo-se aturdido e desestruturado, levantou-se
para exterminar o Espiritismo utilizando-se do ridículo que antes dirigia aos
clérigos e religiosos outros para atingir os médiuns, que eram acusados de
charlatães ou de psicopatas, não ocultando os estertores agônicos em que se
estorcegava.
Enquanto os religiosos
levantavam bandeiras de nova caça às bruxas, repetindo os desgastados refrões
medievais, de intervenção demoníaca na sua conduta, o cepticismo orgulhoso e
vão ridicularizava a mediunidade e os espíritas utilizando-se de epítetos
chulos e mesquinhos, para subestimarem a nova revolução que ignoravam, não
tendo a coragem cultural de se dedicarem ao seu estudo e análise. É sempre mais
fácil combater o que se ignora, mantendo-se na presunçosa figuração de sapiente
do que reconhecer os próprios limites, avançando sempre no rumo de enobrecida
erudição. Isto porque, o conhecimento que realmente liberta, impõe conduta
compatível com as informações constatadas exigindo radical mudança dos hábitos
doentios e primários com os quais se encontra acostumado o indivíduo, para
galgar um patamar mais elevado de comportamento, que exige esforço, porém
compensa pela plenitude que propicia.
O Espiritismo é uma ciência de
profundas conseqüências ético-morais por estruturar-se na compreensão de uma
filosofia existencial estribada no comportamento saudável. De nada adiantaria o
conhecimento da imortalidade da alma e os efeitos da sua conduta terrestre, se
não proporcionasse uma alteração real na maneira de ser do indivíduo que lhe
assimila os paradigmas. Exige, portanto, expressivo esforço do seu adepto para
se adequar aos seus impositivos doutrinários.
Sobrevivendo ao Século das
Luzes que pôde mais clarear com as estrelas fulgurantes das suas propostas,
venceu sobranceiro o Século da Ciência e da Tecnologia, sem que qualquer um dos
seus postulados sofresse alteração ou fosse superado, antes confirmados pelas
diferentes áreas da investigação científica, seja na Física Quântica, quanto na
Biologia Molecular, na Psicologia Transpessoal, quanto na Embriogenia, havendo
enfrentado as mais avançadas conquistas revolucionárias dos últimos tempos
quais os transplantes de órgãos, a criogenia, a clonagem, a fecundação in
vitro, a virusterapia... É o maior adversário da eutanásia, do aborto
criminoso, da pena de morte, do suicídio, das guerras, sempre de pé contra o
direito humano de matar, avançando estóico pelos caminhos do Terceiro Milênio
com as suas propostas libertadoras e nobres, construindo o homem mais saudável,
integral e a sociedade feliz por todos anelados.
Dessa forma, recordando o
ínclito Codificador Allan Kardec, que abriu a cortina da Nova Era com o seu
caráter invulgar de homem de bem, de erudição e de dignidade, nós, os
Espíritos-espíritas agradecemos a sua contribuição e valor, por haver sido o
excelente instrumento do Mundo espiritual para a Humanidade no momento mais
grave do pensamento histórico de todos os tempos.
Homenagem a Allan Kardec, Vianna de Carvalho
Página psicografada pelo
médium Divaldo P. Franco, na noite
de 4 de junho de 2001, em Paris, França
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